Dados do Trabalho
Título
TRATAMENTO CIRURGICO DE BLEFAROESPASMO GRAVE POR SINDROME DE MEIGE: RELATO DE CASO
Resumo
Introdução: O blefaroespasmo é uma forma de distonia focal, caracterizada por contrações involuntárias e progressivas do músculo orbicular do olho. Faz parte da apresentação da Síndrome de Meige, em que há distonia oromandibular associada. Sua fisiopatologia não é bem compreendida, e com a evolução da doença pode ocasionar cegueira funcional. O tratamento pode seguir diversas abordagens, sendo a toxina botulínica a terapia de primeira linha direcionada aos espasmos, mas há limitações, como a impossibilidade de tratar deformidades palpebrais associadas ao blefaroespasmo e a resistência imunológica a toxina. Dentre as técnicas cirúrgicas para tratamento do blefaroespasmo, destaca-se a descrita por Gillum e Anderson em 1981, a qual envolve meticulosa ressecção dos músculos orbicular da pálpebra, prócero e corrugador. Objetivos: O objetivo do trabalho é relatar o caso de um paciente com blefaroespasmo grave e refratário submetida à técnica cirúrgica de miectomia de Gillum e Anderson. Método: O caso em questão foi manejado pela equipe de Cirurgia Plástica do Hospital Universitário Evangélico Mackenzie, e os dados coletados provém de revisão de prontuário, registros fotográficos dos autores e revisão de literatura. Resultado: Paciente feminina, 58 anos, branca, com blefaroespasmo grave e cegueira funcional de 3 anos de evolução, com início dos sintomas após trauma emocional. Espasmos refratários a aplicação de toxina botulínica. Diagnosticada com Síndrome de Meige por espasmos orofaciais associados. Foi optado por uma abordagem cirúrgica, utilizando a técnica de miectomia de Gillum e Anderson. Discussão: Com o tratamento cirúrgico, amenizamos o grau dos espasmos musculares, além de melhorarmos alterações funcionais e/ou estéticas, como ptose de sobrancelhas e dermatocalase. A paciente apresentou melhora significativa dos blefaroespasmos após a cirurgia, conseguindo manter abertura ocular espontânea. Conclusão: No caso em questão, a técnica demonstrou-se satisfatória no tratamento desta condição, sendo importante o conhecimento da técnica de Gillium e Anderson no arsenal terapêutico do blefaroespasmo refratário. Desta forma, a abertura ocular completa nestes pacientes, que costuma ser o sintoma mais incapacitante, reinsere a paciente na vida social e devolve função e autonomia.
Introdução
O blefaroespasmo é uma forma de distonia focal, caracterizada por contrações involuntárias e progressivas do músculo orbicular do olho (pré-tarso, pré-septal e periorbital) e dos músculos prócero, depressor do supercílio e corrugador (1,2). O início geralmente é espontâneo, sendo os espasmos bilaterais, intermitentes ou persistentes.
O blefaroespasmo pode ocorrer de forma isolada ou associado a outras condições, como à distonia oromandibular - denominando-se Síndrome de Meige. A síndrome caracteriza-se por blefaroespasmo e distonia oromandibular, podendo estar associada a movimentos complexos dos músculos faciais inferiores, boca, mandíbula, língua, músculos faríngeos e cervicais (2,3). Dentre as manifestações da síndrome, o blefaroespasmo é o sintoma mais comum, precoce e incapacitante ao paciente. Geralmente, inicia-se na sexta década de vida, sendo mais prevalente em mulheres. Sua fisiopatologia ainda não é bem compreendida, mas estudos recentes defendem que a presença de um gatilho ambiental associado a uma predisposição genética podem causar alterações nas sinapses cerebrais e reduzir a inibição do córtex cerebral sobre os gânglios da base (3).
Com a evolução da doença, o aumento do piscar progride gradualmente para espasmos involuntários de fechamento das pálpebras, podendo ocasionar cegueira funcional (2). Além disso, períodos prolongados de intensos espasmos resultam em ptose do supercílio, dermatocalase e, frequentemente, em defeitos na aponeurose do músculo levantador e no tendão cantal lateral (4).
O tratamento pode seguir diversas abordagens, sendo a toxina botulínica a terapia de primeira linha direcionada aos espasmos (1,5). Contudo, muitos pacientes não são adequadamente controlados apenas com injeções de toxina botulínica, fenômeno que pode estar relacionado à apraxia da abertura das pálpebras associada à doença, ao agravamento progressivo do blefaroespasmo ou ao desenvolvimento de resistência imunológica à toxina botulínica. Além disso, ressalta-se que as injeções também não abordam as deformidades palpebrais associadas ao blefaroespasmo - como ptose superciliar, dermatocalase, blefaroptose, entrópio e blefarofimose (1).
Nesse contexto, condutas cirúrgicas alternativas têm sido aprimoradas para o tratamento do blefaroespasmo, sobretudo para pacientes mais graves ou recidivantes. A vantagem dessa abordagem consiste que ela, além de aliviar os blefaroespasmos, também intervém nas deformidades palpebrais associadas à doença, permitindo corrigi-las (1).
Dentre as técnicas cirúrgicas para tratamento do blefaroespasmo, destaca-se a descrita por Gillum e Anderson em 1981, a qual envolve meticulosa ressecção dos músculos orbicular da pálpebra, prócero e corrugador do supercílio e do nervo facial na fáscia retro-orbicular (4). Neste trabalho, será descrito o caso de uma paciente com blefaroespasmo grave e refratário, portadora da Síndrome de Meige, e seu manejo com a técnica cirúrgica de Gillum e Anderson.
Objetivo
O objetivo do trabalho é relatar o caso de um paciente com blefaroespasmo grave e refratário submetida à técnica cirúrgica de miectomia de Gillum e Anderson.
Método
O caso em questão foi manejado pela equipe de Cirurgia Plástica do Hospital Universitário Evangélico Mackenzie, e os dados coletados provém de revisão de prontuário, registros fotográficos dos autores e revisão de literatura.
Resultado
Paciente feminina, 58 anos, branca, apresentava quadro clínico de blefaroespasmo grave e cegueira funcional de 3 anos de evolução, com início dos sintomas após trauma emocional. Já havia realizado tratamento prévio para a condição com psicólogos, psiquiatras, neurologistas e oftalmologistas, além de aplicações de toxina botulínica, com melhora parcial e temporária do quadro.
Ao exame físico, a paciente apresentava blefaroespasmo bilateral grave, com cegueira funcional pela contração persistente e involuntária do músculo orbicular dos olhos, além de apresentar excedente de pele em pálpebras superiores (Figura 1). Associado ao quadro de blefaroespasmo, a paciente apresentava espasmos hemifaciais periorais leves à direita intermitentes, sendo diagnosticada com Síndrome de Meige.
Dessa forma, para o tratamento do blefaroespasmo da paciente, seu sintoma mais incapacitante, foi optado por abordagem cirúrgica, utilizando a técnica de miectomia de Gillum e Anderson modificada.
A cirurgia iniciou pela elevação dos supercílios através de incisão em região temporal e auxílio de agulha Casagrande. Em seguida, foi realizada ressecção do excedente cutâneo da pálpebra superior, isolamento e ressecção do músculo orbicular, preservando-se sua porção pré-tarsal. Ademais, foi realizado ressecção dos músculos prócero e corrugador, preservando-se os nervos supratroclear e supraorbital. Após abordagem da pálpebra superior, foi realizada incisão na pálpebra inferior com ressecção do músculo orbicular, preservando sua porção pré-tarsal novamente. Além disso, foi realizada a transposição de bolsas de gordura da pálpebra inferior.
A paciente evoluiu com melhora do quadro de blefaroespasmo, sem intercorrências ou complicações no pós-operatório, conseguindo manter os olhos abertos voluntariamente (Figura 2). Não realizou novas aplicações de toxina botulínica após a cirurgia, mantém seu quadro estável, satisfeita com o resultado, mantendo acompanhamento com psicoterapia e neurologia.
Discussão
Os objetivos da intervenção cirúrgica incluem reduzir a gravidade dos espasmos, melhorar alterações funcionais e/ou estéticas - por exemplo, ptose de sobrancelhas, dermatocalase, ptose de cílios, distopia cantal, ectrópio - e reduzir a dosagem de toxina botulínica (5). A paciente do caso havia indicação de resolução cirúrgica devido ao alto grau de blefaroespasmo, além do insucesso nas tentativas de tratamento com toxina botulínica em monoterapia.
Conforme descrito na literatura, a complementação com a toxina botulínica após utilização da técnica de Gillum e Anderson pode ser necessária (4). Dessa maneira, a paciente em questão foi orientada em relação à possibilidade de recorrência da condição, sendo indicado tratamentos complementares durante a evolução do quadro.
Em estudo realizado na Clínica Mayo (6), 94% dos pacientes alegaram, subjetivamente, que a miectomia proporcionou a eles benefícios de curto e longo prazo. Da mesma forma, Georgescu et al (7), a partir da análise de 100 pacientes entre os anos 2000 e 2007, constataram que 33% dos pacientes com blefaroespasmo apresentaram cura completa com a cirurgia, 44% apresentaram melhora de mais de 50%, enquanto 66% dos pacientes seguiram o tratamento com toxina botulínica. Nesse sentido, destaca-se níveis consideráveis de satisfação dos pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico para o blefaroespasmo, similar à paciente acima, que apresentou melhora significativa dos blefaroespasmos após a cirurgia, conseguindo manter abertura ocular espontânea. Além disso, a intervenção cirúrgica permitiu também a correção do excesso de pele das pálpebras superiores da paciente, além da ptose de supercílio.
As complicações relacionadas ao tratamento cirúrgico incluem a formação de hematomas, seromas, infecção, paresia do supercílio, anestesia da região frontal, assimetria de supercílio e ceratite (2). A paciente do caso não apresentou complicações, com resultado satisfatório.
Conclusão
Atualmente, há poucos casos descritos na literatura abordando o tratamento cirúrgico do blefaroespasmo com o emprego da técnica de miectomia de Gillum e Anderson. No caso em questão, a técnica demonstrou-se satisfatória no tratamento desta condição, sendo importante o conhecimento da técnica de Gillium e Anderson no arsenal terapêutico do blefaroespasmo refratário. Desta forma, a abertura ocular completa nestes pacientes, que costuma ser o sintoma mais incapacitante, reinsere a paciente na vida social e devolve função e autonomia.
Referências
1. Yen MT. Surgical Myectomy for Essential Blepharospasm and Hemifacial Spasm. International Ophthalmology Clinics. 2018;58(1):63–70.
2. Patel BCK. Surgical Management of Essential Blepharospasm. Otolaryngologic Clinics of North America. 2005 Oct;38(5):1075–98.
3. Pandey S, Sharma S. Meige’s syndrome: History, epidemiology, clinical features, pathogenesis and treatment. Journal of the Neurological Sciences. 2017 Jan;372:162–70.
4. Gillum WN, Anderson RA. Blepharospasm Surgery. Archives of Ophthalmology. 1981 Jun 1;99(6):1056–6.
5. Green KE, Rastall D, Eggenberger E. Treatment of Blepharospasm/Hemifacial Spasm. Current Treatment Options in Neurology. 2017 Sep 30;19(11).
6. Chapman KL, Bartley GB, Waller RR, Hodge DO. Follow-up of patients with essential blepharospasm who underwent eyelid protactor myectomy at the Mayo Clinic from 1980 through 1995. Ophthal Plast Reconstr Surg 1999; 15:106-10.
7. Georgescu D, Vagefi MR, McMullan TF, McCann JD, Anderson RL. Upper eyelid myectomy in blepharospasm with associated apraxia of lid opening. Am J Ophthalmol. 2008;145(3):541-7.
Palavras Chave
Blefarospasmo; Síndrome de Meige; Miectomia
Arquivos
Área
Cirurgia Plástica
Categoria
Cirurgia Plástica
Instituições
Hospital Universitário Evangélico Mackenzie - Paraná - Brasil
Autores
THAYLINE MYLENA SANTANA DE CAMARGO, CAROLINA DA SILVEIRA WELTER, BARBARA SCHMITT, HELOÍSA MELLO TRAPP, DANIELA D'AGOSTINI SPANHOL, MARCELUS VINICIUS DE ARAUJO SANTOS NIGRO