Dados do Trabalho
Título
RECONSTRUÇAO DO COMPLEXO AREOLO-PAPILAR POS-MASTECTOMIA: RELATO DE CASO COM TECNICA HIBRIDA DE AUTO ENXERTIA E DERMOPIGMENTAÇAO
Resumo
A reconstrução do complexo aréolo-papilar (CAP) está alcançando cada vez mais importância na reconstrução mamária pós-mastectomia. O CAP possui grande significado simbólico para as mulheres, sendo parte essencial da mama. A reconstrução do complexo areolo-papilar finaliza a reconstrução da mama após a mastectomia e melhora a satisfação das pacientes com o resultado final. Esta fase é crítica para acrescentar o realismo e a simetria da mama.
Este trabalho relata um caso de reconstrução do complexo aréolo-papilar (CAP) em uma paciente submetida à mastectomia devido a um carcinoma ductal in situ no Instituto Nacional de Câncer (INCA). A reconstrução foi realizada utilizando a técnica de auto enxertia de papila doadora contralateral e micropigmentação dérmica para reconstrução da aréola. O procedimento envolveu marcação, espelhamento do novo CAP, dermopigmentação e enxerto de papila. A paciente apresentou uma evolução satisfatória no pós-operatório, com um resultado estético promissor. O artigo destaca a importância do CAP na reconstrução mamária pós-mastectomia e a eficácia da dermopigmentação como uma opção não cirúrgica. Conclui-se que a combinação dessas técnicas proporciona resultados naturais e satisfatórios, melhorando a autoestima e o bem-estar das pacientes.
Introdução
A restauração do complexo aréolo-papilar (CAP) tem alcançando cada vez mais importância na reconstrução mamária pós mastectomia (PESSOA et al., 2012). O CAP possui grande significado simbólico para as mulheres, sendo parte essencial da mama. A reconstrução do complexo aréolo-papilar finaliza a reconstrução da mama após a mastectomia e melhora a satisfação das pacientes com o resultado final. Esta fase é crítica para acrescentar o realismo e a simetria da mama. A reconstrução ideal deve proporcionar boa simetria, cor, textura e projeção, comparável com a mama normal, e podendo ser alcançada cirurgicamente ou através de dermopigmentação/tatuagem. O melhor material para reconstrução é o CAP do próprio paciente, se este estiver disponível para ser usado como enxerto e se houver concordância pela paciente. A reconstrução da papila já foi realizada com enxertos compostos de mamilo contralateral, de polpa digital do pé ou lóbulo da orelha. Na rotina do Instituto Nacional do Câncer (INCA) é comum a realização de reconstrução de mama (imediata ou tardia) pós mastectomia. Dentre as técnicas de mastectomia, destacamos as que não são poupadoras do complexo aréolo-papilar (CAP), fazendo-se necessário, portanto, a sua reconstrução. Nesse trabalho, a equipe de cirurgia plástica do INCA, diante de uma paciente com necessidade de reconstrução de CAP, optou pela realização da auto enxertia de papila contralateral doadora, associado a micropigmentação dérmica, comumente conhecida como tatuagem, para reconstrução da aréola.
Objetivo
Relatar um caso de reconstrução de CAP com a técnica da auto enxertia de papila doadora contralateral e micropigmentação dérmica, também conhecida como tatuagem, para reconstrução da aréola como alternativa cirúrgica de reconstrução do CAP.
Método
Paciente feminina, 62 anos, mastectomizada à direita devido a um carcinoma ductal in situ, submetida previamente a uma reconstrução de mama direita com retalho grande dorsal e prótese de 450 cc e mamoplastia redutora em mama esquerda para simetrização (FOTO 1).
O procedimento foi iniciado pela marcação do novo CAP, o que é sempre algo desafiador quando se trata de reconstrução de mama, visto que trabalhamos com mamas diferentes. No caso em questão, como havia uma assimetria entre as mamas, os critérios mais importantes para marcação do novo CAP foram a proporção e posição dele na mama reconstruída. O procedimento cirúrgico iniciou-se com o espelhamento do desenho do CAP original da paciente a esquerda com papel de luva e transferência para o lado a ser reconstruído (FOTO 2) a fim de tornar o resultado o mais simétrico e natural possível. Ainda foi realizada a marcação de um refinamento devido a presença de uma área de simastia entre a mama reconstruída e a mama simetrizada.
Foi realizada anestesia local com lidocaína 1% e epinefrina na diluição 1:200.000. Na sequência, foi aplicada a tintura da marca Visage e passado o demógrafo line X2 protegido por capa estéril (FOTO 3) sobre região previamente demarcada como CAP (FOTO 4) a fim de realizar a micro pigmentação dérmica, respeitando a marcação prévia.
Foi realizada a micropigmentação previamente à confecção do enxerto de modo a facilitar o procedimento de dermopigmentação. Após o processo de dermopigmentação, a papila doadora foi demarcada e foi removido o tecido da área doadora. Após a medição da projeção do mamilo normal, foi traçada uma linha em torno da circunferência do mamilo doador de aproximadamente 50% da altura entre a base e a parte superior do mamilo.
A área que receberia o mamilo foi então desepitelizada. O enxerto de papila foi alocado na área desepitelizada da nova papila. Foi realizada sutura contínua com nylon 5-0 em bordas da área enxertada, acomodando a base da nova papila (FOTO 5).
O procedimento foi finalizado com nova etapa de dermopigmentação bilateralmente a fim de igualar as cores das duas aréolas, deixando um resultado mais natural. Por fim, foi realizado um curativo de Brown com fixação utilizando curativo de filme transparente à prova d’agua da marca Tegaderm.
Resultado
A paciente submetida ao procedimento de reconstrução do complexo aréolo-papilar (CAP) apresentou resultados promissores e uma evolução favorável no pós-operatório.
Durante o acompanhamento ambulatorial, não foram observadas complicações significativas, como infecções ou deiscências de sutura. A cicatrização da área doadora e da área receptora da papila enxertada foi adequada, indicando uma boa tolerância do procedimento pelo organismo da paciente.
A avaliação estética do resultado demonstrou uma reconstrução satisfatória do CAP, com uma aparência natural e simétrica. A técnica de auto enxertia de papila doadora contralateral, associada à micropigmentação dérmica, proporcionou uma boa projeção, textura e cor da aréola reconstruída, resultando em uma simetria harmoniosa entre as mamas reconstruída e contralateral. A paciente relatou estar satisfeita com o resultado final da reconstrução, não manifestando a necessidade de realizar novas sessões de dermopigmentação.
Os resultados obtidos neste caso corroboram com a literatura existente, destacando a eficácia das técnicas combinadas de enxerto de papila e dermopigmentação na reconstrução estética do CAP. Essas abordagens proporcionam resultados estéticos satisfatórios, contribuindo significativamente para a melhoria da autoestima e qualidade de vida das pacientes submetidas à mastectomia.
Discussão
O complexo aréolo-papilar (CAP) corresponde a uma estrutura importante para a estética das mamas. Sendo assim, sua ausência ou deformidade pode impactar fortemente a autoestima e o bem-estar de mulheres que passaram, por exemplo, por algum procedimento cirúrgico causador de danos nessa região do corpo (BYKOWSKI et al., 2017).
Neste contexto, a dermopigmentação destaca-se como uma opção não cirúrgica emergente. Neste sentido, Uhlmann e Martins e Piato, (2019), investigaram os resultados estéticos obtidos com a simulação do complexo areolo-papilar removido cirurgicamente durante o tratamento do câncer de mama, por meio de uma técnica de dermopigmentação tridimensional e analisaram o grau de satisfação das pacientes submetidas a esse procedimento. Para isto, 30 pacientes foram selecionadas para participarem do estudo. Ao final do tratamento, os autores encontraram elevados índices de satisfação entre as pacientes, relatando uma taxa de aprovação de 100% versus 73% entre os médicos profissionais da área. Desta maneira, os autores concluíram que, a dermopigmentação, quando associada à reconstrução mamilar prévia, proporciona o benefício de simular o relevo papilar (UHLMANN; MARTINS; PIATO, 2019).
A restauração do complexo aréolo-papilar (CAP) está alcançando cada vez mais importância na reconstrução mamária pós-mastectomia, sendo parte essencial da mama. Vários trabalhos têm demonstrado que a confecção do CAP influencia
positivamente o processo de recuperação dos danos à saúde física e mental inerentes à terapêutica do câncer de mama (UHLMANN; MARTINS; PIATO, 2019; REID-DE JONG; BRUCE, 2020).
Visando aprimorar esse processo, Azouz et al., (2020) criaram um estêncil impresso tridimensional, com o intuito de garantir um resultado estético preciso, consistente e personalizado durante a confecção tridimensional do CAP. De acordo com os autores, o dispositivo criado por eles, elimina a necessidade de terceirizar o serviço da dermopigmentação para outro profissional, garantindo resultados realistas e personalizáveis (AZOUZ et al., 2020).
A confecção do CAP e a consecutiva pigmentação por tatuagem intradérmica são procedimentos cada vez mais realizados pelo cirurgião plástico, visto que é desejável a simetria perfeita entre a mama reconstruída e a contralateral, necessitando de avaliação prévia especializada e precisa (MASELLI et al., 2024).
Após a confecção da neomama com simetria perfeita em relação à contralateral, a reconstrução do CAP constitui o aspecto final do processo. Os principais parâmetros para a reconstrução bem-sucedida do CAP são: simetria, posição, tamanho, projeção, textura e coloração (KURUVILLA et al., 2022). Há diversas técnicas cirúrgicas disponíveis para a reconstrução tanto da papila quanto da
aréola, mas a coloração final do CAP raramente se aproxima à da mama contralateral, exceto quando a papila é enxertada da mama oposta (SISTI et al., 2016; KURUVILLA et al., 2022).
Assim, a pigmentação e a textura da aréola têm sido objeto de estudo de vários trabalhos recentes (GAVA et al., 2020), que buscam resultados permanentes e naturais. Dessa forma, a realização da dermopigmentação da aréola no mesmo tempo em que é feita a reconstrução da papila realizada através de enxertia de papila doadora contralateral da paciente, ou através de uso de retalhos locais, tem apresentado resultados bastante satisfatórios para as pacientes (SOWA et al., 2021; PADULLÉS-ESCARRÉ et al., 2024).
O bom resultado estético pode ser obtido por enxerto de mamilo contralateral, porém nem sempre há tecido doador suficiente, com risco de prejuízo para o lado são. Retalhos locais são comumente utilizados pois a projeção papilar tem sido fator relevante nas técnicas cirúrgicas, pela dificuldade de se manter o resultado. Há tendência ao achatamento e perda da projeção a longo prazo (DAVIS; MILLER; LEE, 2018).
Aliada à técnica de reconstrução da papila, adotamos técnica cirúrgica asséptica e reconstrução da aréola com dermopigmentação, utilizando um demógrafo e tinturas da marca Visage. Na técnica espelhamos o mamilo sadio para o lado contralateral através de um footprint utilizando papel de luva e, em seguida, realizamos a dermopigmentação bilateralmente, pois dessa forma acreditamos que o
resultado estético fica mais natural, simetrizando melhor a coloração de forma bilateral.
Conclusão
Desta maneira, foi constatado que a tatuagem do CAP é o complemento do processo de reconstrução após o tratamento do câncer, além de ser uma opção independente, quando as cirurgias não são possíveis. Somado a isto, o impacto na competência profissional quanto a técnica de dermopigmentação é fundamental para um resultado satisfatório. A maior parte dos estudos relataram altos índices de satisfação com o resultado estético, sendo essa uma técnica considerada segura e capaz de restaurar a integridade da aparência das mulheres que enfrentaram tratamentos demolitivos de câncer, com melhora auspiciosa da autopercepção,
ansiedade, depressão, função sexual e papel de identidade.
O melhor material para reconstrução do complexo aréolo-papilar é o CAP do próprio paciente, se este estiver disponível para ser usado como enxerto, associado a isso, a técnica de dermopigmentação tem a grande vantagem de conseguir um resultado bastante natural e agrega valor ao arsenal de técnicas do cirurgião plástico. Nesse caso foi alcançado um resultado próximo ao natural, com uma boa projeção, textura e cor, deixando a paciente em questão satisfeita.
Referências
PESSOA, SALUSTIANO & MATOS, JULIANA & DIAS, IANA & PESSOA, BRENO & ALENCAR, JULIO. (2012). Técnica simples e segura para a reconstrução areolopapilar com tatuagem intradérmica. Revista Brasileira de Cirurgia Plástica. 27. 415-420. 10.1590/S1983-51752012000300015.
UHLMANN, Natalia Rodrigues; MARTINS, Maria Marta; PIATO, Sebastião. 3D areola dermopigmentation (nipple-areola complex). The Breast Journal, v. 25, n. 6, p. 1214–1221, 2019. DOI 10.1111/tbj.13427.
REID-DE JONG, Victoria; BRUCE, Anne. Mastectomy tattoos: An emerging alternative for reclaiming self. Nursing Forum, v. 55, n. 4, p. 695–702, 2020. DOI
10.1111/nuf.12486
AZOUZ, Solomon; SWANSON, Marco; OMARKHIL, Mirwais; REBECCA, Alanna. A Nipple-Areola Stencil for Three-Dimensional Tattooing: Nipple by Number. Plastic and Reconstructive Surgery, v. 145, n. 1, p. 38–42, 2020.
https://doi.org/10.1097/PRS.0000000000006398.
KURUVILLA, Annet S; GOPMAN, Jared M; CHAM, Samantha; HENDERSON, Peter W. Nipple-areolar tattoo: Comprehensive review of history, theory, technique, and outcomes. Journal of Plastic, Reconstructive & Aesthetic Surgery, v. 75, n. 2, p. 544–
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SISTI, A.; GRIMALDI, L.; TASSINARI, J.; CUOMO, R.; FORTEZZA, L.; BOCCHIOTTI, M. A.; ROVIELLO, F.; D’ANIELLO, C.; NISI, G. Nipple-areola complex reconstruction techniques: A literature review. European Journal of Surgical Oncology (EJSO), v. 42,
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MASELLI, Deborah; TORREGGIANI, Martina; LIVIERI, Tiziana; FARIOLI, Gloria; LUCCHI, Stefania; GUBERTI, Monica. Tattooing to reconstruct Nipple-Areola Complex after oncological breast surgery: a scoping review. Supportive Care in Cancer, v. 32,
n. 153, p. 10, 2024. DOI 10.1007/s00520-024-08351-3.
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Palavras Chave
reconstrução de CAP; dermopigmentação; Reconstrução de mama
Arquivos
Área
Cirurgia Plástica
Categoria
Cirurgia Plástica
Instituições
INSTITUTO NACIONAL DE CANCER - Rio de Janeiro - Brasil
Autores
DUNIA VERONA, ALESSANDRO SILVA MIRON, MARLON CAZAROTTI FARIA, MARJORIE PAVESI FERREIRA, TIAGO RICCI CACHUBA, PATRICIA BREDER DE BARROS