Dados do Trabalho
Título
ANALISE DO PERFIL EPIDEMIOLOGICO DAS FRATURAS ORBITARIAS NO SERVIÇO DE CIRURGIA PLASTICA DO HOSPITAL UNIVERSITARIO DA PUC CAMPINAS
Resumo
Introdução: O trauma facial tem destaque nos atendimentos de emergência em todo o mundo, pois envolve não só tecidos moles e ossos¹, mas também, por extensão, pode acometer estruturas mais nobres como encéfalo, sistema nervoso periférico e olho. Um em cada quatro pacientes acometidos por trauma maxilofacial terão concomitantemente fraturas da órbita². Em casos de indicação cirúrgica e de reconstrução de assoalho orbital, podem ser usados diversos tipos de materiais, sendo eles autólogos, homólogos ou aloplásticos³. Objetivo: Analisar os casos de fratura de órbita, suas particularidades e tratamentos, atendidos pela equipe de cirurgia plástica no Hospital e Maternidade Celso Pierro – PUC Campinas. Métodos: Estudo retrospectivo de 334 pacientes com fraturas orbitárias, atendidos no Hospital da PUC Campinas, São Paulo, Brasil, no período de outubro de 2007 a abril de 2024. Os dados foram obtidos através de protocolo digital para fraturas faciais do serviço de cirurgia plástica do Hospital da Puc Campinas. Em todos os casos, foi realizada avaliação oftalmológica, com análise de mobilidade ocular extrínseca, pressão intra ocular, acuidade visual, fundo de olho e biomicroscopia. O diagnóstico das fraturas orbitárias foi realizado através de tomografia computadorizada de face com reconstrução 3D. Os tratamentos considerados foram o conservador e cirúrgico com reconstrução da parede orbitária, sendo os materiais usados para a reconstrução: cartilagem auricular, tela de titânio e enxerto ósseo. Resultados: O gênero mais acometido foi o masculino (83,2%). As principais etiologias foram acidentes motociclísticos (29,3%) e agressões (22,1%), seguida de quedas da própria altura (17,9%), acidentes automobilísticos (11%), quedas de bicicleta (7%), queda de altura (6%), choque contra algum tipo de objeto (4%) e atropelamento (3%). O uso de bebidas alcóolicas foi incidente em 32% da amostra. O tratamento cirúrgico foi indicado em 64,3% dos casos de fratura orbitária. Conclusão: Pacientes com fraturas orbitárias devem ser preferencialmente atendidos em centros terciários e de referência em traumatismos faciais, com equipe especializada, capaz de prover todo o suporte necessário em lesões complexas. Nosso trabalho está em concordância com a epidemiologia mundial de fraturas orbitárias.
Introdução
O trauma maxilofacial pode ser considerado como uma agressão importante encontrada em centros de trauma devido às consequências emocionais causadas pela possibilidade de deformidades, além do impacto econômico que causa em um sistema de saúde4. A pele da face e os ossos faciais, devido a sua projeção anterior corporal, são extremamente expostos em acidentes com veículos automotores e em vítimas de violência urbana¹.
Em países subdesenvolvidos, altos índices de violência urbana e doméstica contribuem para aumentar o impacto social e econômico do trauma¹.
Um em cada quatro pacientes acometidos por trauma maxilofacial terão concomitantemente fraturas da órbita².
Fraturas orbitárias podem ser subdivididas em alguns tipos, tais como fratura de teto orbital, assoalho orbital ou parede orbital². As paredes orbitárias mais comumente afetadas são a medial e inferior, devido a suas paredes menos espessas.
A consulta de oftalmologia é recomendada amplamente para pacientes com fraturas de face, em especial fraturas de face média e fraturas agudas da parede orbital, com presença de dois ou mais sinais ou sintomas, que se faz preditivo de trauma ocular grave, requerendo a necessidade de consulta oftalmológica urgente².
Segundo Abreu RAM et al. 2010, em casos de indicação cirúrgica e de reconstrução de assoalho orbital, podem ser usados diversos tipos de materiais, sendo eles autólogos, homólogos ou aloplásticos, como cartilagem conchal, tela de titânio e enxerto ósseo. Sabe-se que, independentemente do material adotado, a reconstrução deve ser anatômica, não permitindo extrema rigidez do assoalho orbital³.
Objetivo
Este estudo tem por objetivo analisar casos de fraturas orbitárias atendidas pela equipe de cirurgia plástica do Hospital da PUC Campinas, fazendo correlação entre sua casuística, lesões e fraturas associadas, o tipo de tratamento, o tratamento da cavidade orbitária e via de acesso cirúrgico.
Método
Estudo retrospectivo de análise de casos clínicos de fraturas orbitárias, que foram atendidos pela equipe de cirurgia plástica do Hospital da PUC Campinas, nos setores de urgência e emergência da unidade, ocorridos entre o período de outubro de 2007 a abril de 2024.
As informações clínicas foram coletadas através de análise de prontuários e o protocolo digital do serviço de cirurgia plástica do hospital, setor de crânio-maxilo facial, aprovado pelo Comitê de Ética Médica do Hospital Universitário Puc Campinas, sob o número 009/08.
Os dados foram coletados de 334 pacientes acometidos com fratura orbitária, unilaterais ou bilaterais e acometendo uma ou mais paredes da órbita, ocorridos no período analisado.
O diagnóstico das fraturas foi feita através de tomografias computadorizadas de crânio e face, sem contraste, em cortes sagitais, axiais e coronais de 0,1cm, considerando janelas ósseas, para partes moles e reconstrução 3D, feitas no setor de radiologia do Hospital da Puc Campinas.
Em todos os casos foi realizado exame físico completo de crânio e face para avaliação de lesões e alterações de sensibilidade em face, bem como avaliações de demais especialidades envolvidas no mecanismo de trauma, como cirurgia geral, oftalmologia e neurocirurgia. Na avaliação oftalmológica foram analisados pela equipe especializada os seguintes parâmetros: acuidade visual, motilidade ocular extrínseca, pressão intraocular, fundoscopia e biomicroscopia.
Os dados analisados neste estudo foram referentes ao paciente (idade, gênero, etnia, uso de álcool e drogas ilícitas, traumas associados, exame físico e oftalmológico), o tipo de fratura (data da ocorrência, lateralidade, parede orbitária acometida) e o tratamento instituído (cirúrgico ou conservador e também quanto a técnica de reconstrução da órbita), considerando as incisões cirúrgicas escolhidas (como subciliar, superciliar, transconjuntival, temporal) e o material usado para reconstrução orbitária (cartilagem conchal, tela de titânio ou enxerto ósseo).
Resultado
Do total de 334 casos analisados, 278 (83,2%) indivíduos eram do gênero masculino e, destes, 152 (45,5%) eram brancos, seguidos de 86 (25,7%) pardos e 36 (10,7%) negros. Entre os indivíduos do gênero feminino (16,8%), também prevaleceu a etnia branca, em número de 36 (10,7%) indivíduos, com 15 (4,4%) pardas e 5 (1,4%) negras.
Foram analisados neste estudo indivíduos de 5 a 92 anos de idade. .A faixa etária mais prevalente entre o gênero masculino foi a de 12 a 25 anos, com 75 (22,4%) indivíduos; já entre o gênero feminino, a faixa etária mais prevalente foi a de 26 a 35 anos, com 12 (3,5%) indivíduos,
Entre as principais etiologias das fraturas, destacam-se os acidentes motociclísticos, com 98 (29,3%) registros, seguidas de agressão física e queda da própria altura, com 74 (22,1%) e 60 (17,9%) registros respectivamente. As demais etiologias dos traumatismos estão dispostas no Gráfico 1.
O uso de bebidas alcoolicas se mostrou presente em 127 (38%) dos casos, com 107 (32%) indivíduos do gênero masculino e 10 (2,9%) indivíduos do sexo feminino. O uso de substâncias ilícitas ocorreu em 46 (13,7%) dos casos, em 39 (11,6%) indivíduos masculinos e 7 (2%) femininos. Entre as substâncias psicoativas mais citadas estão maconha, cocaína, crack e LSD.
Do total de pacientes, apenas 10 (2,9%) deles apresentaram exame físico da face normal, sendo edema (80,5%) a alteração mais frequente, seguido de ferimento cortocontuso (41,6%), desvio (24%) e alterações sensitivas (5,8%). Entre os indivíduos, 64 (19,1%) apresentaram alterações no exame oftalmológico, com 24 (7,18%) casos de hemorragia subconjuntival, 8 (2,3%) com alteração da motilidade ocular extrínseca, 6 (1,7%) com enoftalmia, 5 (1,49%) hemorragias retinianas e entre alterações menos citadas estão perfuração ocular, ptose, midríase, diplopia, lesão de nervo óptico, avulsão de globo ocular e hemorragia vítrea.
Com relação a lateralidade, observou-se 48 (14,3%) casos de fratura bilateral, 144 (43,1%) casos de fratura a direita e 142 (42,5%) casos de fratura a esquerda. Foram registrados 44 (13,1%) casos de fraturas naso-orbito-etmoidárias. Observou-se que os tipos mais frequentes de fratura foram de parede inferior e lateral simultâneas, com 86 (25,7%) casos, seguidas de fraturas isoladas de paredes lateral e inferior, com 65 (19,4%) e 64 (19,1%) casos, respectivamente.
Em 151 (45,2%) dos casos ocorreu traumatismo associado, com o trauma de crânio e pescoço presente em 97 (29%) casos, membros superiores em 31 (9,2%) casos, tórax em 28 (8,3%) casos, membros inferiores em 26 (7,7%) casos e 10 (2,9%) casos com trauma abdominal. Fraturas associadas estavam presentes em 198 (59,2%) indivíduos, sendo 121 (36,2%) casos de fratura do osso nasal, 80 (23,9%) casos de fratura de maxila, 32 (9,5%) de fratura de mandíbula, 30 (8,9%) de fratura do osso frontal e 5 (1,4%) casos com fratura de base de crânio.
Quanto ao tratamento, foi indicado procedimento cirúrgico para 215 (64,3%) indivíduos e 119 (35,6%) foram candidatos ao tratamento conservador. Entre os acessos cirúrgicos mais realizados, como podemos ver no Gráfico 2, estão a incisão subciliar, superciliar (Digman) e intraoral, que foram realizadas em 112 (33,5%), 57 (17%) e 56 (16,7%) casos, respectivamente.
Com relação ao tipo de material usado para reconstrução da órbita, em 73 (21,8%) casos foram usados mais de um material distinto. A placa de titânio foi usada em 138 (41,3%) casos para reconstrução da margem orbitária. Conforme demonstra o Gráfico 3, o material mais usado foi a cartilagem conchal, com 89 (26,6%) casos de uso, seguida de 58 (17,3%) casos com uso de tela e 3 (0,8%) realizações de enxerto ósseo.
A presença de intercorrências foi relatada em 24 (7,1%) casos, com 6 (1,79%) episódios de falha de consolidação, 3 (0,89%) de deiscência de sutura, 2 (0,59%) casos de parestesias pós-operatórias, 2 (0,59%) hematomas cutâneos e ocorrências menos frequentes de estrabismo, entrópio, ectrópio, diplopia, fístula maxilar, anosmia e dor tardia. Em todos os casos, as intercorrências ocorridas foram tratadas e sanadas.
Discussão
Neste estudo, foi evidenciada uma grande disparidade de incidência entre os gêneros, com uma maior parte correspondente ao gênero masculino e composta de indivíduos de etnia branca. Este fato também pôde ser observado no estudo conduzido por Abreu RAM et al. 2009, ao afirmar que a maior incidência de trauma orbitário no adulto masculino branco jovem está ligada ao fato de que os homens são a maioria no trânsito, principalmente nas rodovias, praticam mais atividades físicas de contato, frequentam bares como atividade social e abusam mais de drogas, como o álcool, antes de dirigir7.
Shapiro AJ et al. 2021, demons traram em seu estudo correlação entre fraturas faciais e o uso de bebidas alcóolicas, em que 45% da amostra fez o uso das bebidas. Neste estudo, esta forte correlação também pode ser evidenciada, com uma amostra na qual 38% dos pacientes fizeram uso de algum tipo de substância alcóolica.
Dentre as diversas etiologias das fraturas orbitárias neste estudo, prevaleceram os acidentes de trânsito, seguida por lesões relacionadas a agressões e posteriormente por quedas. Tais ordens de incidência também foram comprovadas no trabalho de Brasileiro BF et al. 2006.
Em concordância com o estudo de Tavares SS et al. 2010, o tratamento das lesões observadas foi cirúrgico em sua maioria, com uma taxa superior a 60% de procedimentos, alguns deles com a utilização de mais de um tipo de incisão ou técnica de reconstrução orbitária. O tratamento conservador é indicado quando há limitação leve dos movimentos oculares e ausência de aprisionamento muscular, sinais de enofaltmo ou diplopia. Quando o assoalho orbital é envolvido pelo trauma, sua reconstrução torna-se quase imperativa, devido a fina espessura do osso nessa região8.
Existem diferentes técnicas de acessos cirúrgicos para a região de assoalho orbitário, sendo considerada a melhor técnica aquela na qual há segurança e domínio para realização9. Entre as principiais incisões usadas em nosso trabalho podemos citar a subciliar, transconjuntival, superciliar e temporal. Conforme demonstrou o estudo de Oliveira RB et al. 2005, as intercorrências e complicações não estão associadas ao tipo de acesso cirúrgico escolhido no serviço.
Conforme mostrou o estudo de Oliveira RB et al. 2005, a escolha do material utilizado para a reconstrução do assoalho orbitário está associada a disponibilidade do material, ao custo-benefício e ao planejamento prévio do caso, embora todos devem possuir a propriedade de biocompatibilidade, prevenindo reação de corpo estranho e contaminação local9.
Segundo Abreu RAM et al. 2010, um material considerado ideal para reconstruções orbitárias deve possuir propriedade físicas semelhantes ao tecido que irá substituir.
O estudo de Colombo LRC et al. 2011, demonstrou que enxertos de cartilagem e osso autólogos tem a propriedade de conferir estabilidade ao assoalho da órbita, devido a sua alta resistência e incorporação ao tecido adjacente e vascularização.
O material de preferência no serviço, em concordância com Abreu RAM et al. 2009, foi o uso da cartilagem auricular, com exceção para grandes defeitos, em que se optou pelo uso da tela de titânio para evitar a blindagem da órbita.
Assim como o tratamento instituído, um adequado seguimento destes pacientes deve ser realizado, a fim de reduzir intercorrências e complicações.
Conclusão
Vítimas de trauma orbitário devem ser encaminhadas a um hospital tercário, com serviço de referência de traumatismos crânio-maxilo-faciais, com a devida disponibilidade de material adequado e equipes especializadas como cirurgia plástica, fisioterapia, oftalmologia, neurocirurgia.
Referências
IMAGENS 4 E 5.
Palavras Chave
Trauma de Face; fraturas complexas da face; Ferimentos e traumatismos
Arquivos
Área
Cirurgia Plástica
Categoria
Cirurgia Plástica
Instituições
Hospital Puc Campinas - São Paulo - Brasil
Autores
MATEUS DE CARVALHO CEZARANI, ROGERIO ALEXANDRE MODESTO DE ABREU, ANDREZA CRISTINA CAMACHO VARONI, DANIELLA NUNES CAMARGO, GILSON LUIZ DUZ